terça-feira, 6 de abril de 2010
Carlos Alberto Faraco
O ensino de Gramática nas escolas remonta ao tempo das escolas jesuítas e reflete os modelos ditados pelos portugueses, totalmente desvinculada das práticas de uso da língua, e por isso restrita aos poucos que a estudavam, desconsiderando a realidade e não incorporando à gramática as transformações linguísticas. Determina-se uma forma única, socialmente prestigiada de uso da língua e conseqüentemente de exclusão das outras manifestações. A elite conservadora passou a defender o discurso da unidade absoluta, uma vez que considera a existência de uma só língua e cumpre preservar sua pureza, que nos é dada pelos portugueses, seus proprietários.
Esse caráter conservador do ensino da língua durante o tempo jesuíta e que permaneceu depois durante o período colonial, não se altera nem com a independência, pois se manteve entre as camadas dominantes uma mentalidade elitista e no desejo de branqueamento da raça e da cultura.
Ocorre uma cristalização entre a norma padrão real de uso e a norma cultuada nas gramáticas, mas o padrão real falado continuou mudando, o que complica nossas relações com a norma padrão e seu ensino.
Frente a esta realidade, Carlos Faraco neste artigo propõe a reflexão gramatical sem gramatiquice e estudo da norma padrão sem normativismo para a questão do ensino da gramática nas escolas.
Devemos reconsiderar as nossas relações com o padrão, refletindo sobre diferentes práticas com aquilo que efetivamente se usa atualmente no Brasil na fala formal e na escrita, considerando que esse padrão está em constante modificação.
O ensino da gramática deve refletir sobre a estrutura da língua e sobre seu funcionamento social. Conhecer a norma padrão é parte integrante do amadurecimento das nossas competências linguístico-culturais.
O autor discute sobre a importância do ensino da gramática desde que subordinado ao domínio das atividades de fala e escrita, garantindo a relevância funcional, e deve levar em conta a flexibilidade estrutural da língua e sua riqueza de manifestações das variedades regionais e sociais, considerando os gêneros textuais e discursivos. Dessa forma pretende que se critique os preconceitos linguísticos e que se reconstrua o imaginário nacional sobre a nossa língua
A construção de uma norma padrão teria como propósito uma normatização, uma uniformidade, e que deve ser considerada pelo aluno como também uma das variedades linguísticas. E o ensino deveria expor os alunos uma diversidade gêneros de bons textos para se construir o domínio da norma padrão e das variedades de fala e de escrita.
Título do livro: Aventuras de Rodorón procurando Pipirigalha
Autor(a): Luis Díaz
Editora: Formato
Professora(s): Silvana Rossi Júlio Ano do ciclo: 4º ano – EF I
Tempo previsto: um bimestre
Produto final: escrita de um texto e/ou apresentação dramatizada.
Resenha:
Saiu Rodorón o cavaleiro, uma manhã, buscando Pipirigalha sua princesa. No caminho se depara com o Tatu, a Galinha, sem falar da chuva, quando se vê completamente desbotado... Mesmo assim, lá se foi o herói atravessando vales e montanhas. Em um castelo terrível, sua amada está presa. Quantas portas e colunas! Com tantos obstáculos, Rodorón pensa em desistir de encontrar Pipirigalha... No castelo foi desafiado por um feroz cavaleiro por estar desistindo de sua busca. Rodorón vence a batalha contra o inimigo, quando descobre que o cavaleiro é a sua amada Pipirigalha. Os dois se casam e juntos partem em busca de honra e glória.
Expectativas de aprendizagem:
Leitura:
• Levantamento do conhecimento prévio sobre o assunto.
• Expectativas em função dos textos da capa, quarta-capa, orelha etc.
• Antecipação do tema ou idéia principal a partir dos elementos paratextuais,
como título, subtítulos, epígrafes, prefácios, sumários.
• Antecipação do tema ou idéia principal a partir do exame de imagens ou de
saliências gráficas.
• Confirmação ou retificação das antecipações ou expectativas de sentido
criadas antes ou durante a leitura.
• Identificação das pistas linguísticas responsáveis por introduzir no texto a
posição do autor.
• Identificação do leitor-virtual a partir das pistas linguísticas.
• Troca de impressões a respeito dos textos lidos, fornecendo indicações para
sustentação de sua leitura e acolhendo outras posições.
• Avaliação crítica do texto.
Produção de texto:
• Planejar texto de cavaleiros: o personagem e o lugar onde vive; contexto e o conflito; terminar a história.
• Produzir texto a partir de modelo, levando em conta o gênero e seu contexto de produção, estruturando-o de maneira a garantir a relevância das partes em relação ao tema e aos propósitos do texto e a continuidade temática.
Linguagem oral:
• Ouvir e assistir filmes ou leitura de textos lidos.
• Comparar textos, versões do texto em filme.
• Trocar impressões e participar de discussões.
Materiais necessários:
1. Livro: Aventuras de Rodorón procurando Pipirigalha.
2. Material de pesquisa (livros ou internet) sobre Velásquez, Daimier, Van Gogh, Degas, Miró, Picasso e mosaístas bizantinos.
3. Outros livros ou filmes de histórias de cavalaria e grandes personagens como: El Cid, Rei Artur, Wallace, Dom Quixote e outros.
Bibliografia para o professor:
1. Livro: Aventuras de Rodorón procurando Pipirigalha.
2. Material de pesquisa (livros ou internet) sobre Velásquez, Daimier, Van Gogh, Degas, Miró, Picasso e mosaístas bizantinos.
3. Outros livros ou filmes de histórias de cavalaria e grandes personagens como: El Cid, Rei Artur, Wallace, Dom Quixote e outros.
ANTES DA LEITURA
Descrição das atividades:
1. Propor aos alunos observar a capa do livro e seus elementos. Depois, observar a quarta capa e ler a pequena resenha contida na quarta capa.
2. Explorar os elementos como o cavaleiro, a princesa, os diversos animais e o observador.
3. Ler com os alunos os agradecimentos e o frontispício do livro. Levantar hipóteses do por que o autor citou essas pessoas e pesquisar um pouco sobre elas. Apresentar os quadros que serão utilizados na ilustração do livro.
4. Os alunos podem ser sensibilizados com as histórias de cavaleiros assistindo o filme do Rei Artur e a távola redonda.
DURANTE A LEITURA
Descrição das atividades:
1. Leia a história de Rodorón coletivamente com os alunos. Solicite que fiquem atentos aos diálogos entre os personagens e como a história é apresentada.
2. Explore com os alunos a forma como o autor apresentou a história e pergunte aos alunos qual a características dos diálogos que acontecem entre os personagens no rodapé das páginas.
3. Peça para os alunos observar as ilustrações e identificar algumas das obras dos pintores que o autor destacou nas referências no início do livro.
4. Peça aos alunos que pesquisem no dicionário as palavras que desconhecem e tentem encontrar um dos significados que se adaptam a estrutura da frase original da palavra.
5. O autor nas páginas 6 e 7 se utilizou da ilustração e de um recurso linguístico para fazer um jogo de palavras. Peça para os alunos comentarem essa passagem.
6. A história tem algumas passagens onde o autor se utiliza do humor, cite duas dessas passagens e explique qual o recurso que o autor usou para criar o contexto do humor.
7. Na página 10 o autor remete a um personagem conhecido. Qual é esse personagem? E porque ele tem medo de galinha?
8. Peça aos alunos explicar qual foi a intenção do autor ao utilizar na página 14 a expressão moral da história e a que contexto ela se remete na história.
9. Peça para os alunos observarem a ilustração da página 19 e descobrirem quais os elementos curiosos que o autor utilizou. Depois, peça que os alunos expliquem que imagem de leitor o autor mostra no decorrer da história.
10. Em alguns momentos do livro o autor se utiliza de repetição de algumas estruturas. Peça aos alunos para localizar algumas destas passagens e explicar a intenção do autor.
11. Na página 26 o autor faz uma interrupção da narrativa e se utiliza de um recurso que chamou de nota dos editores. Explique o que compreendeu dessa passagem e o qual foi a intenção do autor.
12. A história do Rodorón remete a muitas vozes e o autor se utiliza de diferentes referências para fazer a relação com essas vozes. Explique alguns dos recursos utilizados pelo autor e exemplifique-os com algumas passagens.
13. Observe os trechos retirados do livro:
“Ó Pipirigalha, linda menina, onde estás tu?”
“De que fugis, boa gente, às pressas, apavorada?”
“Que fizeste, Rodorón? Esta é sua forma de amar?”
Comente a estrutura linguística usada pelo autor e por que.
DEPOIS DA LEITURA
Descrição das atividades:
1. Proponha para os alunos lerem as páginas que falam de alguns personagens citados no livro. Peça para que escolham um deles e façam uma pesquisa em livros e internet. Caso tenham interesse podem ler as histórias dos personagens.
2. Leia com os alunos a história do Rei Artur e a távola redonda e façam uma comparação com a versão que viram do filme.
3. Peça aos alunos para escreverem uma avaliação crítica do texto, considerando os recursos que o autor utilizou e relacionando com o que sabem em relação às histórias de cavaleiros.
4. Proponha aos alunos ler o outro livro de Rodorón: RODORÓN E PIPIRIGALHA ENCONTRAM DOM QUIXOTE DE LA MANCHA.
5. Proponha para os alunos escreverem uma história de cavaleiro ou uma nova aventura de algum dos cavaleiros que estudaram. Caso os alunos queiram eles podem encenar um das histórias.
segunda-feira, 15 de março de 2010
1. Em 2010, o relatório de atividade do CET observou uma queda na velocidade média no trânsito de São Paulo. Qual a velocidade média alcançada pelos veículos na cidade de São Paulo nos horários do rush?
2. O texto discorre sobre algumas explicações para a diminuição da velocidade observadas pela CET. Quais são as explicações e relacione-as com as ações implantadas pela Prefeitura de São Paulo?
3. Avalie os impactos positivos ou negativos das obras que foram citadas no texto?
4. Nesses meses iniciais do ano de 2010 as reportagens de jornais e televisão registraram várias situações de caos no trânsito de São Paulo, muitas delas relacionadas às enchentes. Porém, na última sexta-feira, São Paulo registrou um recorde de trânsito no horário de pico do final do dia. Comente sobre a causa do ocorrido e relacione com as explicações dadas no texto pela CET.
5. Observe algumas frases do texto:
“No rush, carro está tão veloz quanto galinha”
“Na prática, os veículos tem circulado no rush mais devagar do que um corredor da São Silvestre (...)”
No final do texto o autor inclui gráfico e informações relacionadas à velocidade médias de diferentes elementos. Reflita qual foi a intenção do autor ao usar todos esses recursos no texto.
terça-feira, 2 de março de 2010
quinta-feira, 25 de junho de 2009
Texto-base: PIAGET, Jean. “A explicação do jogo”. In: ______. A formação do símbolo na criança. Rio de Janeiro: LTC, 3ª ed., 1990, p. 188-216.
Para Piaget, o jogo teve definições que envolviam isoladamente diferentes aspectos. No processo de aprendizagem, esses aspectos estão envolvidos, e o jogo acontece como que propiciando à incorporação de uma dada realidade exterior aos esquemas mentais da criança. O jogo ocorre desde os primórdios de dissociação entre a assimilação e a acomodação.
“O jogo simbólico está para o jogo de exercício como a inteligência representativa está para a inteligência sensório-motora. Entretanto, se existe assim filiação no sentido diacrônico, é preciso acrescentar, do ponto de vista sincrônico, que o jogo simbólico é, para a inteligência representativa, aquilo que o jogo de exercício é para a inteligência sensório-motora, isto é, um desvio ou uma dissociação no sentido da assimilação pura.
É na relação assimilação, desequilíbrio, acomodação, assimilação, que as crianças vão observando, o mundo e os objetos, criando representações e atuando sobre essas representações, relacionando significantes e significados, alterando em equilíbrios momentâneos, e assimilações e acomodações que constituem um desenvolvimento para um novo estágio.
Vygotsky, L. S. A formação social da mente.São Paulo: Martins Fontes, 1989. p. 89 - 103.
terça-feira, 23 de junho de 2009
FARACO, Carlos Alberto. Autor e Autoria. In: BRAIT, Beth (Org.). Bakhtin: Conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2005, p. 37 - 60
Os trechos selecionados trazem a discussão sobre os conceitos de autor e autoria.
" Mesmo que a voz do autor-criador seja a voz do escritor como pessoa, ela só será esteticamente criativa se houver deslocamento, isto é, se o escritor for capaz de trabalhar em sua linguagem permanecendo fora dela." (p. 40)
"Posto em termos de linguagem, o princípio da exterioridade (a lógica imanente da criação estética) demanda do escritor que ele desista de sua linguagem, saia dela, liberte-se dela, olhe-a pelo olho de outra linguagem, desloque-a para outrem ao mesmo tempo em que se desloca para outra linguagem" (p. 41)
Segundo Bakhtin, é preciso haver deslocamento da linguagem para a autêntica criação estética. Para que haja uma autêntica criação estética é necessário que o autor-criador fale através de uma linguagem que provenha do conjunto múltiplo e heterogêneo das vozes ou línguas sociais da cultura humana.
Para conseguir isto o autor deve deslocar-se de sua própria linguagem, se colocar numa posição exterior ao texto.
O autor, tem um diálogo com várias fontes: o leitor, outros autores e outros textos, o autor com seu texto e outras vozes que conversam durante a construção do texto. Nessa relação, o autor precisa se afastar do texto e se posicionar em relação a sua produção com uma postura de análise, permitindo planejar e construir suas estratégias de escrita que relacionam todos os espectros que envolvem a questão de seu texto.
segunda-feira, 22 de junho de 2009
INHELDER, Bärbel, PIAGET, Jean. A psicologia da criança. Tradução de Octávio Mendes cajado. São Paulo: Difel Editorial, 1985.
A integração dessas estruturas sucessivas, aonde a anterior conduz à construção da seguinte, possibilita organizar o desenvolvimento em estágios que obedecem alguns critérios:
1. A ordem da sucessão é constante, apesar das idades médias poderem variar conforme o grau de inteligência e da influencia do meio social;
2. Cada estágio se caracteriza por um conjunto de estruturas que explicam a função de reações particulares;
3. As estruturas de conjunto são interativas e não se substituem uma às outras.
O grande problema desse processo de desenvolvimento e a direção integrativa que se pode reconhecer nele é compreender o mecanismo; pois as explicações são provisórias e as teorias explicativas têm o desafio de integrar as interpretações da embriogenia, do crescimento orgânico e do desenvolvimento mental.
Nesse momento, discutiremos os quatro fatores estabelecidos até agora para a evolução mental:
1. Um fator é o crescimento orgânico e, especialmente, a maturação do complexo formado pelo sistema nervoso e pelos sistemas endócrinos. Ainda conhecemos quase nada das condições de maturação que possibilitam a constituição das grandes estruturas operatórias. Vemos que a maturação consiste em abrir possibilidades novas e constitui condição necessária do aparecimento de certas condutas, mas, para isso, que a maturação seja acrescentada de um exercício funcional e de experiência. E quanto mais as aquisições se afastam das origens do sensório-motor, mais variável é a sua cronologia, ou seja, nas datas de aparecimento, de mostra a importância das influências do meio físico e social.
Este aspecto possibilita olharmos para a importância da escola, desde o início da infância com a Educação Infantil, onde a ampliação das experiências e a influência do meio físico e social desafiador e rico de experiências podem favorecer ao desenvolvimento mental das crianças.
2. Um segundo fator é o papel do exercício e da experiência adquirida na ação efetuada sobre os objetos, fator necessário na formação das estruturas lógico-matemáticas. Um fator complexo porque existem dois tipos de experiência: a) a física (ação sobre os objetos para abstrair as propriedades); b) a lógico-matemática (agir sobre os objetos para coordenar as ações). A experiência física constitui uma estruturação ativa, é sempre assimilação a quadros lógico-matemáticos. E as estruturas lógico-matemáticas são devidas à coordenação das ações do sujeito e não às pressões do objeto físico.
As experiências com o objeto, as abstrações e generalizações que faço sobre seu uso, materialização, função e até funcionamento, constituem as relações que o sujeito estabelece e que favorece a formação das estruturas lógico-matemáticas. É como se as relações, ao mesmo tempo em que se constituíssem, formassem uma rede de relações que me permite abstrações, generalizações e formação de conceitos, que podem se ampliar e aprofundar no processo de vida.
3. O terceiro fator é o das interações e transmissões sociais. A socialização é uma estruturação em que o indivíduo contribui, tanto quanto recebe; mas mesmo em situações em que o sujeito é mais receptivo (transmissão escolar), a ação social é ineficaz sem uma assimilação ativa da criança, o que pressupõe instrumentos operatórios adequados.
A imersão em um meio com interações sociais ricas e diversas possibilitam que o indivíduo troque e contribua com experiências, informações, culturas, valores e outros aspectos, que dependem da assimilação ativa da criança, para se constituir e modular com o meio social em que vive, portanto os fatores se acrescem e se inter-relacionam em processo.
4. Os três fatores são insuficientes em si só e não fazem uma evolução dirigida. E num plano a priori, não poderia realizar-se biologicamente senão pelos mecanismos do inatismo e da maturação, que já conhecemos a nossa insuficiência em explicá-los. No caso do desenvolvimento da criança há uma construção progressiva tal que cada inovação só se torna possível em função da precedente. A explicação do desenvolvimento deve tomar em consideração a dimensão ontogenética e a social, no sentido da transmissão sucessiva das gerações, mas o problema se coloca análogos nos dois casos, pois a questão central é o mecanismo interno de todo construtivismo. Tal mecanismo é observável na construção parcial e em cada passagem de um estágio ao seguinte, é um estagio de equilibração, de auto-regulação, isto é de sequência de compensações ativas do sujeito em resposta às perturbações exteriores e de regulação ativa e antecipadora, que constitui um sistema permanente de tais compensações.
Para considerarmos esses quatro fatores como uma possível explicação da evolução intelectual e cognitiva da criança, é necessário considerar o desenvolvimento da afetividade e da motivação. Vimos que a afetividade constitui a energética das condutas, cujo aspecto cognitivo se refere apenas ás estruturas. Portanto, não existe conduta intelectual que não comporte fatores afetivos; assim, como não poderia haver estados afetivos sem a intervenção de percepções ou compreensão, que constituem a sua estrutura cognitiva. É precisamente esta unidade de conduta que torna os fatores de evolução comuns aos aspectos cognitivos e afetivos, e a sua irredutibilidade em nada exclui um paralelismo funcional.
Acreditamos que na realidade atual da escola e seu contexto social e histórico, esta consideração do Piaget, que relaciona com proximidade a evolução intelectual e cognitiva da criança com o desenvolvimento afetivo e de motivação, possa mapear aspectos importantes para repensarmos a estrutura da instituição escola. Começando com alguns questionamentos: Como observar estruturas e fatores tão relacionados, dialéticos e interdependentes no desenvolvimento mental da criança e organizar um processo de estudo fragmentando de conhecimentos, dos anos, das disciplinas, das etapas para diferentes capacidades com uma estrutura tão linear? Será que a escola e os profissionais que se propõem “formar” os alunos, têm a amplitude e profundidade desse contexto de interdependências cognitivas e afetivas e de relações interpessoais? Às vezes, percebo-me questionando sobre a necessidade de desenvolver a noção de “sustentabilidade”, essa facilmente aplicada para o ambiente e seus sistemas, e formular como seria uma aplicação do próprio ser humano no seu processo de desenvolvimento? Pode parecer um questionamento impróprio, mas ele “preserva” a necessidade de permitir que algumas relações do processo de desenvolvimento cognitivo e afetivo da criança possam ser resguardadas de um processo escolar que “desmata” explorações e atividades constituintes da etapa de desenvolvimento das crianças, como o jogo e brincadeiras simbólicas; ou que “explora os recursos naturais” ao propor uma série de atividades para que possa explorar e observar objetos, como se isso fosse possível e suficiente para construir a relações de fatores que se constituem por possibilidade da maturação, onde há a integração de estruturas sucessivas, aonde a anterior conduz à construção da seguinte, que dependem das interações e transmissões sociais, e através de auto-regulação, a criança assimila e constitui um sistema permanente de tais compensações, e com uma inter-relação entre a conduta intelectual e os fatores afetivos. E como seria essa escola que percebe o complexo processo de desenvolvimento mental da criança e que compreende o mecanismo interligado de fatores e será uma instituição capaz de organiza uma estrutura suficientemente flexível para dar conta da diversidade de necessidades, ao mesmo tempo em que não perde o foco de sua função?
Vimos que as regulações dependem diretamente do modo aqui considerado, e toda a evolução ulterior, é um progresso contínuo, que conduz as regulações à reversibilidade (sistema completo de compensações, onde cada transformação corresponde a possibilidade de uma inversa ou de um recíproca) e a uma extensão não interrompida desta última.
A equilibração por auto-regulação constitui um processo formador de estruturas que desenvolvemos na dialética viva e vivida dos sujeitos que se acham ás voltas, em cada geração, tentando soluções que possam ser melhores do que as das gerações precedentes.
"Finalmente, queremos sugerir, que uma direção produtiva para o estudo da constituição do escritor está na busca de compreensão sobre os diversos planos de dialogia implicados na produção escrita [...]" (GÓES, 1993, p. 115)
Em que se fundamenta tal sugestão? Que dados analisados orientam tal necessidade de compreensão?
GÓES, Maria Cecília Rafael de. A criança e a escrita: explorando a dimensão reflexiva do ato de escrever. IN: SMOLKA, Ana Luíza B.; GÓES, Maria Cecília Rafael de (Orgs). A linguagem e o outro no espaço escolar: Vygotsky e a construção do conhecimento. Campinas (SP): Papirus, 1993.
Tal fundamentação se apoia no estudo sobre produção escrita, onde percebeu-se que o processo de desenvolvimento dos alunos passavam inicialmente por uma relaçao individual de produção e que não se preocupa espontaneamente com as instancias dialógicas, mas através da interação, da mediação que apontava questões sobre esse âmbito, as crianças eram capazes de usar estratégias e formular aspectos que considerassem o lugar do escritor e do leitor.
O trabalho descrito no texto de Maria Cecília de rafael Góes (1993) tinha como interesse o desenvolvimento, na criança, da capacidade de fazer "propostas de compreensão" e a emergência de ações sobre a linguagem na produção escrita.
O processo de crescimento se faz tanto pela ação do sujeito com suas estratégia e conhecimentos e a emergência de ações so bre a linguagem de produção escrita.
O processo de crescimento ocorre tanto na atividade do sujeito com suas estratégias e conhecimentos constrídos, quanto na participação dos mediadores, em especial no ambito escolar. Conforme Vygostky (1984,1987), a criança está inicialmente centrada mais no objeto do dizer - naquilo sobre o que se diz - do que no próprio dizer - no que e no como se diz. No aspecto da linguagem escrita, da interação enunciador-enunciatário, que caracteriza a função comunicativa, nasce uma relação do sujeito com sua própria escrita. O funcionamento individual implica que a escrita se transforma em meio de ação reflexiva, permitindo ao sujeito elaborar enunciados deliberadamente e torná-los como objeto de análise em termos de adequação, consistencia, lógica etc.
No estudo feito, foram observadas as seguintes situações: explicitação de enunciados comproblemas, reinserção de enunciados inadequadamente encadeados, expansão de segmentos de texto pouco desenvolvidos e elaboração de esquema temático do texto como um todo. E observou-se uma semelhança de critérios em pregados na identificação de problemas textuais em situações de análise individual e análise com ajuda de um parceiro,as crianças tenden a ignorar problemas de organização de enunciados. Porem, conseguiam operar sobre os mesmos, com diferentes graus de êxito, quando se apoiavam nas orientações dadas pela entrevistadora.
As crianças com menor experiência tenderam a operar sobre problemas textuais usando a estratégia de dizer mais (completar ou adicionar enunciado), enquanto que no nível mais avançado apareceu em tendência mais forte a dizer de novo (substituir enunciado).
As crianças mostraram não se preocupar com aspectos dialógicos na análise de seus textos de forma espontânea, mas quando o mediador questiona, pode construir estratégias que consideram os lugares do escritor e do leitor.
Góes (1993), pontua que se assuma o desenvolvimento individual como precedente ao interativo (geneticamente) e, de forma semelhante, uma capacidade monológica à dialógica.
terça-feira, 2 de junho de 2009
Que diálogo podemos estabelecer entre as concepções de autoria e de enunciado de Bakhtin e a proposição de Flower e Hayes acerca da escrita enquanto atividade de resolução de problemas
Pensando nas concepções desses autores, percebo alguns pontos possíveis para este diálogo entre Baktin e a proposições de Flower e Hayes, começaremos com a citação:
“(...) o discurso do autor-criador não é a voz direta do escritor, mas um ato de apropriação refratada de uma voz social (...) O escritor é, então, a pessoa capaz de trabalhar numa linguagem enquanto permanece fora dessa linguagem.” (Baktin, 2005, p.40)
Essa citação do Baktin se aproxima das proposições do Flower e Hayes sobre as reflexões que os escritores mais experiente fazem ao pensar para quem vão escrever, com que gênero e com qual preocupação de convencimento deste leitor.
“Estabelecer objetivos de comunicação para atingir o leitor pode ser muito produtivo para o escritor. (...) ter intenções claras com relação ao efeito que seu texto deve provocar no leitor, é o modo mais eficiente para um escritor produzir novas idéias durante o processo de composição. Um segundo objetivo (...) é o que envolve a relação que o escritor deseja estabelecer como o leitor, a imagem de si mesmo (...) O terceiro objetivo que um escritor tem em mente quando escreve em texto envolve suas incursões na tentativa de construir uma cadeia coerente de ideias a fim de atribuir sentido ao que pretende dizer. (...) O quarto objetivo (...) Flower e Hayes (1994, p. 71) observaram que decisões básicas sobre o gênero e a sequenciação de ideias parecem ser tomadas logo no início da composição do texto, (...)” (Flower e Hayes, 1994)
A rede de idéias que o autor vai criando enquanto elabora sua escrita depende dos conhecimentos que ele tem sobre o assunto que vai desenvolver, sobre o gênero que vai escrever e o arcabouço de recursos linguísticos que pode utilizar, a relação que vai construir com o leitor e por conseqüência a imagem de autor que assumirá em sua composição.
Nesse aspecto uma proposição do Bakhtin apóia o olhar dessa imagem do autor-criador:
“ (...) o pressuposto bakhtiniano forte do primado da alteridade, no sentido de que tenho de passar pela consciência do outro para me constituir”. (Bakhtin, 2005, p.43)
É através do outro, do olhar do outro sobre mim mesmo, sobre a imagem que o outro tem sobre o que sou, sobre o que aparento ser é que constituo como ser. A influência do social, a relação que estabeleço com ele, minhas representações e imagens influenciam e constituem a noção que construo de minha realidade. E ao escrever posso elaborar como a relação com o leitor pode acontecer, a imagem ou a voz que pretende criar para representar no texto.
O enunciado para Bakhtin é a palavra em uso social, que reflete um contexto e se encontra impregnado de valores do autor, construindo um diálogo com outros enunciados, um diálogo com pares escritores. O texto da materialidade ao enunciado e ao discurso do autor, em uma relação semiótica.
Nas conclusões de seus trabalhos Flower e Hayes colocam:
“Escritores com mais recursos respondem a todos os aspectos do problema retórico: representem não somente a audiência e a tarefa como tembém seus objetivos envolvendo o leitor, a construção de uma imagem de sis, o foco a ser dado para o conteúdo semântico e a utilização dos recursos linguísticos que estruturam o texto. (...) não somente em extensão, mas em profundidade.” (Flower e Hayes, 2005, p. 7- 8)
quinta-feira, 28 de maio de 2009
O desenvolvimento mental da criança surge como sucessão de três grandes construções, onde cada uma prolonga a anterior, reconstruindo-a para depois ultrapassá-la, cada vez mais amplamente. Isto ocorre, passando por todos os estágios, desde os esquemas sensórios-motores, que ultrapassa as estruturas orgânicas no curso da embriogenia, passando da construção das relações semióticas que serão reconstruídas e ultrapassadas até constituir as estruturas das operações concretas, e finalmente o pensamento formal, que reestrutura as operações concretas, os desdobramentos em novas estruturas se prolongará por toda as transformações da vida ulterior.
A integração dessas estruturas sucessivas, aonde a anterior conduz à construção da seguinte, possibilita organizar o desenvolvimento em estágios que obedecem alguns critérios:
1. A ordem da sucessão é constante, apesar das idades médias poderem variar conforme o grau de inteligência e da influencia do meio social;
2. Cada estágio se caracteriza por um conjunto de estruturas que explicam a função de reações particulares;
3. As estruturas de conjunto são interativas e não se substituem uma às outras.
O grande problema desse processo de desenvolvimento e a direção integrativa que se pode reconhecer nele é compreender o mecanismo; pois as explicações são provisórias e as teorias explicativas têm o desafio de integrar as interpretações da embriogenia, do crescimento orgânico e do desenvolvimento mental.
Nesse momento, discutiremos os quatro fatores estabelecidos até agora para a evolução mental:
1. Um fator é o crescimento orgânico e, especialmente, a maturação do complexo formado pelo sistema nervoso e pelos sistemas endócrinos. Ainda conhecemos quase nada das condições de maturação que possibilitam a constituição das grandes estruturas operatórias. Vemos que a maturação consiste em abrir possibilidades novas e constitui condição necessária do aparecimento de certas condutas, mas, para isso, que a maturação seja acrescentada de um exercício funcional e de experiência. E quanto mais as aquisições se afastam das origens do sensório-motor, mais variável é a sua cronologia, ou seja, nas datas de aparecimento, de mostra a importância das influências do meio físico e social.
2. Um segundo fator é o papel do exercício e da experiência adquirida na ação efetuada sobre os objetos, fator necessário na formação das estruturas lógico-matemáticas. Um fator complexo porque existem dois tipos de experiência: a) a física (ação sobre os objetos para abstrair as propriedades); b) a lógico-matemática (agir sobre os objetos para coordenar as ações). A experiência física constitui uma estruturação ativa, é sempre assimilação a quadros lógico-matemáticos. E as estruturas lógico-matemáticas são devidas à coordenação das ações do sujeito e não às pressões do objeto físico.
3. O terceiro fator é o das interações e transmissões sociais. A socialização é uma estruturação em que o indivíduo contribui, tanto quanto recebe; mas mesmo em situações em que o sujeito é mais receptivo (transmissão escolar), a ação social é ineficaz sem uma assimilação ativa da criança, o que pressupõe instrumentos operatórios adequados.
4. Os três fatores são insuficientes em si só e não fazem uma evolução dirigida. E num plano a priori, não poderia realizar-se biologicamente senão pelos mecanismos do inatismo e da maturação, que já conhecemos a nossa insuficiência em explicá-los. No caso do desenvolvimento da criança há uma construção progressiva tal que cada inovação só se torna possível em função da precedente. A explicação do desenvolvimento deve tomar em consideração a dimensão ontogenética e a social, no sentido da transmissão sucessiva das gerações, mas o problema se coloca análogos nos dois casos, pois a questão central é o mecanismo interno de todo construtivismo. Tal mecanismo é observável na construção parcial e em cada passagem de um estágio ao seguinte, é um estagio de equilibração, de auto-regulação, isto é de sequência de compensações ativas do sujeito em resposta às perturbações exteriores e de regulação ativa e antecipadora, que constitui um sistema permanente de tais compensações.
Para considerarmos esses quatro fatores como uma possível explicação da evolução intelectual e cognitiva da criança é necessário considerar o desenvolvimento da afetividade e da motivação. Vimos que a afetividade constitui a energética das condutas, cujo aspecto cognitivo se refere apenas ás estruturas. Portanto, não existe conduta intelectual que não comporte fatores afetivos; assim, como não poderia haver estados afetivos sem a intervenção de percepções ou compreensão, que constituem a sua estrutura cognitiva. É precisamente esta unidade de conduta que torna os fatores de evolução comuns aos aspectos cognitivos e afetivos, e a sua irredutibilidade em nada exclui um paralelismo funcional.
Vimos que as regulações dependem diretamente do modo aqui considerado , e toda a evolução ulterior, é um progresso contínuo, que conduz as regulações à reversibilidade (sistema completo de compensações,onde cada transformação corresponde a possibilidade de uma inversa ou de um recíproca) e a uma extensão não interrompida desta última.
A equilibração por auto-regulaçao constitui um processo formador de estruturas que desenvolvemos na dialética viva e vivida dos sujeitos que se acham ás voltas, em cada geração, tentando soluções que possam ser melhores do que as das gerações precedentes.
Jean Piaget nasceu a 9 de Agosto de 1896 na cidade de Neuchâtel, na Suíça. Era filho de Arthur Piaget, professor de Literatura Medieval na Universidade de Neuchâtel, e de Rebecca Jackson.Estudou Ciências Naturais na Universidade de Neuchâtel. Frequentou a Universidade de Zurique onde contactou com a psicanálise. Trocou depois a Suíça pela França onde efectuou os seus primeiros estudos experimentais de psicologia do desenvolvimento.Em 1923 casou com Valentine Châtenay. Deste casamento teve três filhas: Jacqueline, Lucienne e Laurent, cujo desenvolvimento intelectual foi por si meticulosamente estudado.
Em termos psicológicos, a sua investigação tem por objectivo central o estudo dos dispositivos que o indivíduo utiliza para perceber o mundo. Como epistemólogo, procurou determinar cientificamente o processo de construção do conhecimento. Nos últimos anos da sua vida centrou os seus estudos no pensamento lógico-matemático.Piaget não propõe um método de ensino mas apresenta uma teoria do desenvolvimento cognitivo cujos resultados são utilizados por psicólogos e pedagogos.Faleceu a 16 de Setembro de 1980 em Genebra.
terça-feira, 26 de maio de 2009
O nome do autor não é, pois exatamente um nome próprio como os outros. [...] o nome do autor funciona para caracterizar um certo modo de ser do discurso [...] (FOUCAULT, 2006, p. 273)O nome do autor não está localizado no estado civil dos homens, não está localizado na ficção da obra, mas na ruptura que instaura um certo grupo de discursos e seu modo singular de ser. Conseqüentemente, poder-se-ia dizer que há, em uma civilização como a nossa, um certo número de discursos que são providos da função “autor”, enquanto outros são dela desprovidos. (FOUCAULT, 2006, p. 274)
Foucault em seu discurso discute a relação do texto e o autor, compreendendo os locais onde a função do autor é exercida. O autor precisa ser considerado como referencia do texto, desconsiderando as características individuais do sujeito que escreve, “(...)o nome do autor funciona para caracterizar um certo modo de ser do discurso (...)indica que esse discurso não é uma palavra cotidiana (...), mas que se trata de uma palavra que deve ser recebida de uma certa maneira e que deve, em uma dada cultura, receber um certo status.” (FOUCAULT, 2006, p.274). A função do autor situa o discurso em um determinado contexto histórico, de uma cultura e delimita termos e exclui outros do corpo do discurso, ele não ocorre uniformemente em todos os discursos, mas pode referir-se a vários sujeitos que se relacionam em variedades de posições.
Foucault também levanta outros aspectos que são questionados que são a função da obra e a função da escrita. “(...) a obra desses instauradores não se situa em relação à ciência e no espaço que ela circunscreve; mas é a ciência ou a discursividade que se relaciona à sua obra como as coordenadas primeiras.” (FOUCAULT, 2006, p.283). Onde a obra refletiria coordenadas que balizariam discursos nos textos do autor e do contexto que ele está inserido, pois são referencias para a ciências e os pares de autores que refletem sobre o campo. Foucault discute as noções de:
1. Redescoberta – “entenderei os fenômenos de analogia ou de isomorfismo que, a partir das formas atuais do saber, tornam perceptível uma figura que foi embaralhada, ou que desapareceu.” (FOUCAULT, 2006, p.283)
2. Reatualização – “a reinserção de um discurso em um domínio de generalização, de aplicação ou de transformação que é novo para ele.” (FOUCAULT, 2006, p.284)
3. Retorno a – um movimento que tem sua própria especificidade e que caracterizs justamente as instaurações de discursividade. Para que haja retorno, de fato, é preciso inicialmente que tenha havido esquecimento, (...) essencial e constitutivo.” (FOUCAULT, 2006, p.284)
segunda-feira, 11 de maio de 2009

"Na escritura múltipla, com efeito, tudo está para ser deslindado, mas nada para ser decifrado; [...]" (p. 63) “[...] um texto é feito de escrituras múltiplas, oriundas de várias culturas e que entram umas com as outras em diálogo, em paródia, em contestação; mas há um lugar onde essa multiplicidade se reúne, e esse lugar não é o autor, como se disse até o presente, é o leitor: o leitor é o espaço mesmo onde se inscrevem, sem que nenhuma se perca, todas as citações de que é feita uma escritura; a unidade do texto não está em sua origem, mas no seu destino, mas esse destino já não pode ser pessoal: o leitor é um homem sem história, sem biografia, sem psicologia; ele é apenas esse alguém que mantém reunidos em um mesmo campo todos os traços de que é constituído o escrito." (p. 64)BARTHES, R. A morte do autor. In: ______. O Rumor da Língua, São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 57-64.
domingo, 8 de março de 2009
Na última aula, compartilhar com o grupo a análise de Odisséia, a montagem do quebra-cabeça, foi um exercício extremamente prazeroso. Aos poucos, cada um expunha sua versão, colocava uma peça e o cenário foi se formando.
Agora, inicio uma viagem solo! Deparo-me com várias peças soltas pela mesa e já percebo as dúvidas: Começo pelo canto do quebra-cabeça? Monto primeiro a porção do cenário que parece mais definida? E o céu de nuvens que se formou sobre alguns versos como uma grande massa acinzentada? Por onde começo?
Passo a primeira muralha de resistência, leio uma vez, leio duas. Com o lápis na mão, começo a olhar para as peças e penetrar na imagem de Camões.
No primeiro verso, ele já enumera três ingredientes, “Erros meus, má fortuna, amor ardente”, como se fosse uma combinação mortal. Erros que o autor cometeu durante a vida, e no plural parecem intensificar a sensação de muitos erros e reforça o “sobejar”. A má fortuna, a má sorte, o destino ingrato, e com ela a infelicidade dos aspectos se somou. O que me remete a Maquiavel com a expressão Vitu e Fortuna e as definições adaptadas: "virtù é o conjunto das nossas qualidades pessoais e fortuna são os fatores fora de nosso controle, digamos, a nossa "sorte".[1] O amor ardente, esse sim desejado por todos! Porém, o autor provoca em mim uma dúvida: “Que para mim bastava amor somente”. O verso suscitou duas leituras possíveis, a primeira mostra que, se considerarmos os três aspectos, para o autor bastaria o amor, ficava só com o amor; a segunda mostra, que só o amor já é suficiente para que as incertezas e riscos imperem.
“Tudo passei”, a marca que passou, ficou no passado e faz um forte contraponto com “mas tenho tão presente /a grande dor das causas que passaram”, dando a noção de continuidade, pois as marcas das feridas permanecem vivas com ele. A expressão “magoadas iras” reforça a presença das feridas, com sentimentos que costumam fazer marcas mais profundas, como magoa e raiva, esse último ampliado pelo termo “ira”, que logo me remete a cenas de desentendimento e brigas amorosas. E conclui o verso se expressando a sua desilusão de “já” não querer ser contente, de perceber a impossibilidade de amar sem dor e de ter aprendido muito cedo com as dores.
No próximo verso, o autor parece reconhecer o discurso infundado que baseava suas esperanças com o amor, como se facilitasse ou desse margem para que magoas acontecessem, “Dei causa a que a Fortuna castigasse”, e a Fortuna ser escrita em letra maiúscula personifica as pessoas que o magoaram.
Encerra o soneto com outro verso que constata os seus desenganos com o amor “De amor não vi senão breves enganos”. Utiliza-se de um vocativo para clamar por alguém “Oh! quem tanto pudesse”, que pudesse amainar “Este meu duro Gênio de vinganças!”, duro por se fechar e endurecer com as feridas e o autor se personifica nesse Gênio de vinganças.
A grande dor das cousas que passaram
Carlos Drummond de Andrade – Farewell
Drummond remete ao soneto de Camões, utilizando-se de uma frase que contextualiza a dor com as magoas do amor e da continuidade descrevendo o florescer de um novo amor que descongelasse essa dor, respondendo ao clamor de Camões.
A dor do passado se transforma em prazer quando resgata em fotos, que estão se desfazendo, a imagem de um amor antigo: “transmutou-se em finíssimo prazer / quando, entre fotos mil que se esgarçavam,”. E o autor novamente destaca a força do destino no verso “tive a fortuna e graça de te ver”, graça que pode ser interpretada como uma dádiva, uma benção ou até mesmo como simbologia de um amor.
“Os beijos e os amavios que se amavam”, remetem a um contexto de namoro, com jogos de sedução e encantos que distraiam o “querer” dos namorados. Lembrança que renasce para refrescar essas sensações “outra vez reflorindo, esvoaçaram em orvalhada a luz de amanhecer”.
Drummond evoca o soneto de Camões como uma referência ao passado e à dor pungente e o consola com um presente terno e prazeroso com o soneto que exalta o ressuscitado amor, que se alimenta da memória reconstruída pelas fotos convertendo o horror e doçura.
Apto 43
Marina Colasanti
O texto da Marina Colasanti fala de uma relação que se iniciou com o “resgate” de animais, uma pomba ferida na asa e um carneiro abandonado em um terreno baldio, onde se inicia uma “suave convivência”. A relação com os bichos era permeada pelos sons dos animais, por seus alimentos e pelo “ruminar de três paciências”, por momentos de remoer e refletir que eram permitidos. A relação parece beneficiar a pessoa, que fica “mais doce” com a pomba e “mais manso” com o carneiro.
“Amavam-se nos cômodos estreitos”, a frase tem a intenção de garantir essa harmonia na convivência, mas em seguida a autora começa a descrever os cuidados e controle para que os animais não fugissem. A dependência da pessoa e sua insegurança aparecem estampadas quando a autora afirma “A vida sem seus amigos parecia-lhe impossível”. O estado de cerceamento sobre os animais começa a mostrar os primeiros efeitos colaterais, deixando a pomba voar de forma atordoada e o carneiro nervoso.
E a relação se transforma de suave para a fúria do ataque da pomba sobre os olhos da pessoa até afundar em sangue e o bater de patas sobre o corpo caído, em sinal de reprovação, desejando dar fim à carne com seus dentes.
O texto nos convidar a refletir como um amor se inicia de forma companheira e afetuosa, mas que pode se transformar em algo que cerceia e aprisiona. Instigando a revolta e a necessidade de lutar. E novamente retoma a analogia com o soneto de Camões, onde a ira e a fúria dos desencontros do amor estimula o Gênio de vinganças.
Klimt veio a minha cabeça, por sua representação do beijo, o amor, como uma colcha de retalho em um campo de flores, um patchwork de experiências e vivências que cada um traz para a relação, podendo se fundir em uma imagem harmoniosa ou não.
[1] Consulta em: http://tradutor-profissional.blogspot.com/2007/10/virt-e-fortuna.html. Acesso em 08/03/09.